Halloween: histórias de visagens paraenses ganham vida nas páginas de livros e na tela de cinema
Autores e cineastas buscam valorizar essas lendas e assombrações em obras que mantêm viva a essência cultural da região
As narrativas de visagens - como são nomeados, no Pará, às aparições fantasmagóricas-, transmitidas oralmente de geração em geração, são parte essencial da cultura paraense. Quem nunca ouviu, ou até mesmo presenciou, um episódio envolvendo seres sobrenaturais? Muitas vezes contadas em reuniões familiares ou na roda entre amigos, perpetuam há anos uma atmosfera enigmática em torno da cidade de Belém e pelos interiores. Em alusão ao Halloween, celebrado em 31 de outubro, o Grupo Liberal mostra que a temática das visagens pode ultrapassar o imaginário popular e influenciar a literatura quanto as produções audiovisuais da região.
Escritor José Maria Brito de Moura (Nathan de Moura) e o túmulo da "Moça do Táxi", no cemitério de Santa Izabel (Márcio Nagano / Arquivo O Liberal)
Entre os autores que transformaram relatos sobrenaturais em obras literárias está José Maria Brito de Moura, conhecido pelo pseudônimo de Nathan Moura, criador da página no Instagram ‘Belém de Arrepiar’. Ele é autor de cinco livros dedicados ao sobrenatural paraense: ‘O Livro Assombroso’, ‘Casas Mal Assombradas’, ‘Lendas e Assombrações do Estado do Pará’, ‘Fantasmas de Hospitais de Belém’ e ‘Café Com a Matinta’.
O interesse do criador de conteúdo por assuntos sobrenaturais começou ainda na infância e se intensificou na adolescência, quando passou a frequentar locais considerados mal-assombrados e conversar pessoas que tinham vivenciado fenômenos paranormais.
"A minha produção literária está diretamente relacionada a essa caminhada. Ouço as histórias das pessoas e me inspiro nelas", comentou Nathan.
Durante suas pesquisas, Nathan já vivenciou situações sobrenaturais. Uma das mais impactantes ocorreu enquanto ele entrevistava uma família em Icoaraci que estava sendo vítima de fenômenos poltergeist, ou seja, fenômenos sobrenaturais não explicados pela ciência.
“Enquanto eu entrevistava a dona da casa, vi uma blusa pegar fogo do nada”, relatou. Essa experiência acabou fazendo parte de seu primeiro livro.
Essa busca por reavivar o imaginário paraense também alimenta o cinema local. Um desses exemplos é o trabalho feito pelo cineasta e roteirista Rod Rodrigues, responsável pelo curta-metragem de animação Visagens e Visões, lançado este ano. A obra, em estilo motion comics, foi livremente inspirada no livro ‘Visagens e Assombrações de Belém’ de Walcyr Monteiro. O curta, produzido com incentivo do Edital Prêmio FCP e co-produzido pelo Muirak Studio e Insoner Lab, reconta quatro histórias do livro em um formato de antologia: Moça do Táxi, Lobisomem da Pedreira, Porca do Reduto e Homúnculo do Largo da Sé.
Segundo Rod Rodrigues, a conexão pessoal e cultural da equipe do curta, formada inteiramente por paraenses, com o livro de Monteiro, serviu de ponto de partida para o projeto.
“Cresci entre a vida urbana de Belém e o cenário rural do vilarejo BomFim, em São João Ponta, e mesmo sendo dois lugares diferentes, nos dois eu costumava ouvir histórias de visagens. Fazem parte da nossa cultura e dos nossos aprendizados, estão relacionadas com a configuração e transformação dos nossos espaços e comunidades, surgindo muitas vezes da relação com a nossa natureza e costumes, e esses relatos são repassados pelas nossas gerações”, explicou.
Com a intenção de representar essa relação com as histórias locais, o curta é narrado por meio do encontro entre um taxista e uma passageira. Na trama, o personagem Raimundo compartilha com Josephina relatos sobrenaturais que atravessam bairros e décadas da cidade. A jovem passageira, que está afastada da cidade, aos poucos se reconecta com suas raízes enquanto ouve as histórias.
“Sempre vi o livro do Walcyr como uma viagem pela cidade. Cada capítulo acontece em um bairro e década específica, contando um relato de um morador da região que se deparou com alguma situação ‘visagenta’”, acrescentou.
Rod destaca que o curta visa não só a adaptação das histórias, mas também a valorização da tradição oral paraense e a preservação da memória local. “Todo roteiro surge e segue a essência básica do livro: reforçar que contar nossas histórias fortalece nossa cultura, preserva nossa memória e faz com que as nossas diferentes comunidades resistam”, afirmou.
Fonte: O Liberal
Texto: Amanda Martins
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