Descubra como avenida Nazaré se tornou uma importante via

 Ainda no século XVIII, a área que hoje é caracterizada pela movimentada avenida Nazaré era uma estrada, com características rurais, e ainda pouco habitada

A avenida Nazaré atualmente | FOTO: CELSO RODRIGUES


Considerada parte do centro de Belém, hoje, a avenida Nazaré já foi símbolo do processo de expansão de Belém para áreas mais distantes do que, à época do período colonial, era considerada a cidade. Ainda no século XVIII, a área que hoje é caracterizada por uma movimentada avenida era uma estrada, com características rurais, e ainda pouco habitada. Diretamente relacionada ao episódio do achado da imagem de Nossa Senhora de Nazaré, a avenida ajuda a contar, também, parte da história da própria cidade de Belém.

A professora da Faculdade de Geografia da Universidade Federal do Pará (UFPA) e coordenadora do Projeto Roteiros Geo-turísticos da UFPA, Maria Goretti Tavares, aponta que a avenida Nazaré surge no século XVIII, no período colonial, quando Belém ainda se resumia basicamente ao bairro da Cidade Velha e ao bairro da Campina. Nesse período, porém, Plácido encontra a imagem de Nossa Senhora de Nazaré às margens do igarapé que passaria na área atrás de onde hoje está a Basílica Santuário de Nazaré. A partir daí, tem início não apenas as manifestações de devoção à santa em Belém, como também a própria formação da estrada que viria a se tornar a atual avenida. “Leva-se a santinha para o Palácio do Governo, mas ela volta para o local do achado. Há aquela lenda e, aí, resolvem, então, construir uma ermida ali no local em que foi encontrada, lá pelo século XVIII. Com isso, se cria um caminho que seguia, mais ou menos, do centro em direção à ermida, que é esse caminho da antiga Estrada de Nazaré”.

Ainda nos séculos XVIII e XIX, Belém vivencia o início de uma expansão da cidade. Já no final do século XIX, com a Belle Époque ocorre a migração das famílias mais ricas para as áreas mais altas da cidade, leia-se o bairro de Batista Campos, a parte alta do Umarizal e a Nazaré. “Há aquela ideia, no início do século XX, de fazer de Belém uma cidade francesa, seria a Paris dos trópicos”, contextualiza a professora. “Nesse modelo de Paris, temos aquelas praças, o bonde, as largas avenidas, que eram os boulevares – daí surge a Boulevard Castilhos França – e, ao mesmo tempo, o nosso prefeito da época, o intendente Antônio Lemos, tem a ideia de diminuir a temperatura, tornar a cidade mais agradável e, com isso, ele faz o projeto de arborização com as mangueiras”.

 

Antônio Lemos
 Antônio Lemos | Foto: Reprodução

 

A professora reforça que, apesar de Belém ter uma identidade ligada às mangueiras, hoje, elas não são árvores típicas da região, mas sim do Oriente. Apesar disso, Antônio Lemos escolheu a mangueira como parte do seu projeto de arborização da cidade pelo fato de ela crescer de 30 a 40 metros, criar sombreamento, além de dar o fruto. Um cenário emblemático desse projeto de arborização da cidade é visto justamente na avenida Nazaré. “Essas mangueiras vão surgir justamente nessa época e principalmente nessas áreas mais novas, nessa parte da cidade que começava a se expandir: Gentil Bittencourt, Presidente Vargas e avenida Nazaré”, aponta Maria Goretti Tavares. “É uma avenida de fundamental importância para a gente até falar da história da cidade de Belém, desde a descoberta da santinha, lá no início do século XVIII, até hoje e com transformações ao longo do tempo. É um símbolo da cidade, com o túnel das mangueiras, com a passagem das principais procissões do Círio”.

TRANSFORMAÇÕES

Entre as transformações vivenciadas pela antiga estrada está a característica das construções encontradas ao longo da Nazaré, de acordo com cada época vivenciada. A geógrafa Vivian Albuquerque, que produziu sua dissertação de mestrado a respeito da avenida Nazaré, aponta que ainda no início do processo de formação da avenida Nazaré existiam em Belém várias estradas, ramais que não eram habitados pelas pessoas da elite da cidade à época. Com uma característica ainda muito rural, essas estradas eram habitadas pelos caboclos e indígenas, em moradias ainda muito simples. A Nazaré era justamente uma dessas estradas.

“Quando começa a aparecer aquele circuito de devoção à imagem, depois que Plácido encontra a santa, o governador da época manda abrir mais ainda porque havia esse fluxo de pessoas”, conta. “Uma curiosidade é que, quando começa essa romaria, o governador manda instalar algumas feiras, pequenos comércios ao redor da Igreja. O que a gente tem, hoje, com os parques no Círio de Nazaré é muito antigo. Claro que, naquela época, não tinham esses parques que a gente tem hoje, mas começaram a ter feiras com brinquedos, com comidas daquela época para as crianças e para atrair o público. Assim, a Estrada de Nazaré foi se desenvolvendo”.

A avenida Nazaré faz parte de um dos roteiros desenvolvidos pelo Projeto Roteiros Geo-turísticos, da Universidade Federal do Pará. A coordenadora do projeto, Maria Goretti Tavares, aponta alguns destaques que ajudam a contar parte da história da avenida:

 

Professora Maria Goretti Tavares
 Professora Maria Goretti Tavares | Foto: Divulgação

 

- Uma característica marcante da avenida Nazaré foi a presença do que se pode chamar de Cinelândia de Belém, já que, no início do século XX, no entorno do Arraial de Nazaré vão surgir vários cinemas que, em sua maioria, infelizmente, já não existem mais. Os dois últimos que fecharam foram o Cinema Nazaré e o Cinema Iracema. Porém, ainda há um cinema que resiste ao tempo naquela região, o único cinema de rua de Belém além do Cine Olympia, que é o Cine Ópera.

- Outra característica importante da avenida é que nela estão localizadas as sedes sociais de dois importantes clubes de Belém: o Paysandu e o Remo.

- Dos casarões antigos da época da borracha, o mais significativo é o Palacete Faciola, que atualmente passa por reforma.

- A partir da década de 70, Belém passa por uma intensificação do processo de verticalização e a avenida Nazaré vai ser um dos corredores que vai receber a implantação de muitos prédios. Dentro desse processo é possível destacar o Edifício Manoel Pinto da Silva, que marca esse início da verticalização ainda na década de 50. Na época, ele era o prédio mais alto de toda a Amazônia.

Alguns palacetes desse período ainda podem ser vistos ao longo da via

Ainda nesse período, a região da Estrada de Nazaré era uma área que abrigava as antigas Rocinhas, casas de veraneio do povo paraense da época. “Já quando vem o período da Belle Époque, no final de 1800 e início de 1900, no período áureo da borracha, a cidade precisa expandir. A elite precisa ir para outras áreas e vai, principalmente, para a Nazaré porque o Antônio Lemos também passa a fazer toda aquela política de reconstrução da estrada. O que era estrada passa a ser avenida, então, é nesse período que muda de nome”, pontua Vivian. “Ele manda colocar a iluminação pública e os bondes elétricos, então, muda completamente a avenida Nazaré e aí é que ela se torna mesmo uma avenida de moradia da elite que passa a viver lá. O que eram as antigas Rocinhas são destruídas e são construídos, no lugar, os casarões e palacetes”.

 

Geografa  Vivian Albuquerque
 Geografa Vivian Albuquerque | Foto: Divulgação

 

Alguns palacetes desse período ainda hoje podem ser vistos na avenida, como é o caso do Palacete Faciola, na esquina da Rua Doutor Moraes, e que passa por obras de restauro. Para a funcionária pública federal Selma Freire, 60, essa beleza e riqueza histórica encontrada ao longo da avenida poderia ser mais bem cuidada. “A avenida Nazaré é uma avenida muito importante, sem dúvida, mas que merecia mais atenção principalmente para a promoção do turismo e também da circulação dos próprios moradores”, avalia, ao contar que mora próximo à avenida. “Mas é uma avenida muito bonita e de grande importância”.

Outra construção marca um período histórico do desenvolvimento da avenida, a Basílica Santuário de Nazaré. Apesar de a construção atual ser diferente da erguida inicialmente para abrigar a imagem da santa, o ponto marca o local onde o achado teria ocorrido em 1700. Apesar de não ser religioso, o designer Joaquim Rodrigues, 29, tem grande admiração pela referência cultural que o Círio de Nazaré e a Basílica Santuário representam. “Eu adoro essa parte da cidade e a Basílica é uma construção muito importante da avenida Nazaré”.




Fonte: Dol.com

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