Ícone da MPB, obra de Elis Regina se mantém viva até os dias de hoje


Considerada uma das mais marcantes vozes do Brasil, cantora completaria 75 anos nesta terça-feira (17)

Dona de um inesquecível timbre e da interpretação de rara emoção que conquistou gerações de fãs, Elis Regina completaria 75 anos nesta terça-feira (17), se ainda estivesse viva. A intérprete gaúcha que fez história da Música Popular Brasileira faleceu no dia 19 de janeiro de 1982, vítima de overdose de cocaína aos 36 anos de idade. A obra de Elis Regina se mantém viva nas gravações de época e também no repertório revisitado por vários artistas. No Pará, a cantora Alba Mariah é a principal representante da "Pimentinha", que mantém casas lotadas com o show "Elis Vive", em cartaz há quase 11 anos, em Belém. O baterista paraense Sagica foi contratado pelo Canecão para participar do musical do disco "Saudade do Brasil" (de 1980), por dois anos, no Rio de Janeiro, indicado pelo contrabaixista paraense Kzam Gama, já falecido, que trabalhou mais tempo com ela.
"Elis me acompanha desde criança, sou apaixonada por ela desde a primeira vez que ouvi", recorda Alba Mariah. "Passei a consumir tudo dela após o disco "Viva a Brotolândia" (1961), cantando músicas brasileiras mais rebuscadas. A minha paixão aumentou na adolescência, passei a me identificar com as letras. Ela era primorosa no lançamento de novas músicas e compositores, que ela imortalizou. Eu ficava esperando o que ia sair de novo da Elis para aprender as músicas porque eu já queria ser cantora. Ela foi a minha escola musical, onde tenho técnica, sensibilidade de atitude e renovação", revela.
Com 38 anos de carreira, a cantora paraense morou por sete anos na Itália e 13 anos na França, onde se apresentava com o repertório de MPB, incluindo as canções da ídola. Na volta pra casa, ela decidiu montar um show inteiro com músicas de Elis Regina: "Ela gravou muita coisa, deu para pensar repertórios diferentes". Somente no ano passado, Alba apresentou "Elis Vive" dez vezes em diferentes locais, entre teatros e casas noturnas, sempre com ingressos esgotados com antecedência. A reação do público após cada apresentação surpreende a própria intérprete: "As pessoas comentam comigo que ficam felizes de sentirem emoção nas minhas interpretações, sentirem a minha veracidade e o meu envolvimento grande como artista nessas obras da Elis, além de perceber a minha personalidade no trabalho. Vejo o público muito envolvido emocionalmente, com uma saudade muito grande da Elis, assim como eu. Percebo que somos cúmplices nessa saudade, cantamos juntos e acabamos nos aproximando mais (entre nós) e também nos aproximando dela".
Já Sagica traz recordações profissionais da época em que tocou nos shows da gaúcha: "Não tive muito acesso a ela, foi muito bom (o período que tocou no show de Elis)". Ele conta que foi chamado por intermédio de Kzam Gama, que já era contratado da banda da artista. "Eu tocava na mesma banda que ele, com Guilherme Coutinho. O diretor do espetáculo pediu 'aquele batera é muito sincronizado com você, dá o contato pra ver se ele vem. Isso pode ser muito bom para o show'", detalha. "Quando o trabalho é feito num padrão mais evoluído, não tem intimidade. Saiu do palco ninguém se conhece. É um mundo completamente profissional", descreve. "A gente é só o motivo pra uma imaginação da plateia, que curte do jeito dela".

História

Com mais de 20 discos lançados em vida, os mais famosos foram "Elis & Tom" (1974), com os hits "Águas de Março", "Retrato em Preto e Branco", "Corcovado" e "Só Tinha de Ser com Você"; "Falso Brilhante" (1976); "2 na Bossa" com jair Rodrigues (1965) que traz canções como "Preciso Aprender a Ser Só", "Terra de Ninguém" e "Arrastão"; "Em Pleno Verão" (1970) com "Vou Deitar e Rolar" e "As Curvas da Estrada de Santos"; "Elis" (1972) com a clássica "Casa de Campo"; "Saudade do Brasil", com a famosa interpretação de "Maria Maria", e "Elis" (1980) com a canção "Aprendendo a Jogar".
No final de 2019, o filho mais velho da cantora, o produtor musical e empresário João Marcello Bôscoli, lançou "Elis & Eu", pela Editora Planeta, que traz memórias e fotos da relação mãe e filho, incluindo de uma festa regada à cocaína que o menino testemunhou na madrugada, no apartamento da família, e da última vez que a viu com vida, quando passou mal e foi levada ao hospital pelo namorado Samuel Mac Dowell. O autor estava com 11 anos de idade quando perdeu a mãe. O livro traz também lembranças afetuosas, do rigor maternal e do privilégio de testemunhar ensaios. Casado com a apresentadora Eliana, Marcello é filho de Elis com o produtor musical, compositor e jornalista Ronaldo Bôscoli, com quem a cantora foi casada. Elis deixou outros dois filhos, os cantores Pedro Mariano e Maria Rita, filhos de Cesar Camargo Mariano, que estavam com 6 e 4 anos de idade, respectivamente, quando ela morreu.
Duas biografias dela foram publicadas em 2015. Em "Elis Regina- Nada Será como Antes", pela editora Master Book, o crítico e repórter do Estadão Julio Maria narra a vida da artista a partir de pesquisas e entrevistas, desde a juventude em Porto Alegre, quando, ainda anônima, cantava "Fascinação" com as amigas no colégio, até o fim da vida. Enquanto o maestro, pianista e jornalista Arthur de Faria, em "Elis- Uma Biografia Musical", pela editora Arquipélago, coleciona 30 anos de histórias de instrumentistas, produtores e arranjadores sobre a trajetória dela, desde a formação musical até a fama, incluindo bastidores da indústria fonográfica, desmistificação de boatos, fatos da vida pessoal e episódios marcantes da carreira. Segundo ele, Elis Regina "tinha ouvido de músico", era uma "grande instrumentista que não tocava nenhum instrumento" e tinha "faro" para lançar compositores.
Em 2016, a curiosidade sobre a vida dela reacendeu com o filme "Elis", de Hugo Prata, tendo a atriz Andréa Horta como protagonista. O drama aborda a infância em Porto Alegre, a rápida fama alcançada no Rio, os altos e baixos da carreira e da vida pessoal, incluindo a apresentação feita para o regime militar, que a levaram a ser criticada por vários artistas à época em que alguns estavam sendo presos, torturados e exilados, apesar da cantora se posicionar sempre contra a Ditadura.


Fonte: O Liberal/Música (Texto e Foto)



Nenhum comentário