Historiadora Lilia Moritz Schwarcz lança livro 'Sobre o Autoritarismo Brasileiro
Escravidão e racismo, mandonismo, patrimonialismo, corrupção,
desigualdade social são alguns dos temas abordados
"História não é bula de remédio nem produz
efeitos rápidos de curta ou longa duração", observa a antropóloga e
historiadora Lilia Moritz Schwarcz. "Ajuda, porém, a tirar do véu do
espanto e a produzir uma discussão mais crítica sobre nosso passado, nosso
presente e sonho de futuro".
Tais frases figuram na introdução de Sobre o Autoritarismo
Brasileiro (Companhia das Letras), livro que apresenta, de forma sucinta e
acessível, explicações para uma sociedade que ainda sofre com uma injusta
hierarquia, violência desmesurada, ações de racismo e soluções por vezes
antidemocráticas.
Pesquisadores costumam esperar alguns anos, às vezes décadas, para
avaliar determinados momentos que marcam uma sociedade - a distância temporal
permite uma avaliação crítica mais segura e abrangente. Mesmo ciente, Lilia
baseou-se em informações sólidas e pesquisas rigorosas para, sem correr risco,
apresentar um equilibrado retrato do Brasil em tempo real.
Os capítulos do livro se dividem entre os males do País:
escravidão e racismo, mandonismo, patrimonialismo, corrupção, desigualdade
social, violência, raça e gênero e intolerância. Entre todos, o da corrupção é
o maior. Seria o pior dos males?
"Não seria isso. O maior número de páginas se explica pela
minha preocupação em ser idônea e independente, pois, no caso da corrupção,
diferente dos outros temas, eu seria acusada de parcialidade se pulasse
qualquer político ou período histórico. Inicialmente, pensei em começar pelo
período da presidência de Fernando Collor de Mello, mas precisei retornar até a
Primeira República. E, do lado mais recente, houve a necessidade de se chegar
até a Operação Lava Jato sem se esquecer de nenhum nome".
Para a escritora, não é à toa que este seja o tema mais importante
para o público. "A ponta do iceberg. Também a violência é um tema
preocupante, além dos demais, igualmente importantes. Tentei criar uma teia
entre os assuntos, pois a concentração de renda está vinculada ao nosso
mandonismo. E, em Estados onde isso acontece, há também um maior investimento
na bancada dos parentes, ou seja, um patrimonialismo".
A historiadora mostra, que para avançar, o País precisa assumir
que os brasileiros teriam uma certa tendência a apoiar teses mais autoritárias.
"Somos um país em que, a todo momento, revelamos nossa raiz autoritária -
por conta do nosso passado, mas também por conta do nosso presente. Eu me
preocupo com o fato de nós, brasileiros, termos muito forte esse sentimento de
denegação, ou seja, colocar sempre a culpa no passado. O livro procura mostrar
que existem raízes do passado, mas que estamos construindo, de forma muito
evidente e nada pacífica, o nosso presente. Por isso, acredito que os
brasileiros, em momentos de crise, mostram uma veia autoritária".
Ainda segundo Lilia, a era digital favoreceu governos com
discursos autoritários. "Vivemos hoje a onda de discursos autoritários das
'democraduras' (como definiu José Murilo de Carvalho), que têm algumas
características comuns: o ataque à imprensa e à intelectualidade, uma histeria
em relação às novas agendas de gênero e sexualidade, e o uso das redes sociais.
Mas, veja bem, não é o caso de se demonizar essas redes, que têm uma veia
democrática muito importante ao amplificarem as vozes. E grupos minoritários
têm na internet um local de expressão muito importante para expor suas demandas
por direitos civis".
Mas o livro não traz apenas constatações pessimistas, ele aponta
caminhos para um futuro diferente do que se trilha atualmente. "Um dos
caminhos é fortalecer as nossas instituições. A democracia é a melhor forma
para se construir um país mais generoso, mais inclusivo, plural de fato. Como
deixar essa democracia mais forte? Fortalecendo as instituições, os três
poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário. Outro caminho é o da educação:
quanto mais anos tem de educação, mais tolerante fica um cidadão. Quanto mais
bons professores ele tem, melhor cidadão ele será. É uma aposta de futuro. Só a
educação tem a capacidade de desativar esse gatilho da desigualdade
social".
Que surjam mais livros e artigos sobre esse assunto tão importante para entender e esclarecer o Brasil
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