23ª Feira do Livro fez história com espaços de inclusão para deficientes



Acessibilidade e mobilidade representam uma questão global que ainda é um desafio no Brasil. Em Belém, a 23ª Feira Pan-Amazônica do Livro e das Multivozes faz história, garantindo pela primeira vez acessibilidade total em libras. O acesso para cadeirantes e a disponibilidade de estandes voltados para cegos também fortalecem a tônica de ouvir as várias vozes.
Organizado pela Secretaria de Cultura do Pará (Secult) e realizado no Hangar Centro de Convenções, o evento favorece a acessibilidade, disponibilizando profissionais selecionados a partir de um edital de credenciamento para acompanhar deficientes (surdo e mudo) pela feira.
Para o diretor de Cultura da Secult, Junior Soares, a presença dos intérpretes garante abertura para todos os públicos. “Desde o início da concepção desta edição da feira, pensamos em maneiras de facilitar o acesso de pessoas com deficiência, incluindo mais uma voz à qual o evento atende”, ressalta.
Canais de inclusão - Pela feira, é possível encontrar canais inclusivos, como no estande do Lamparina Acesa, projeto da Universidade Estadual do Pará (UEPA) que já atuava de maneira voluntária em edições anteriores do evento. Em 2019, os profissionais do projeto foram filtrados e puderam garantir auxílio em áudio descrição e libras.

Foto: Alex Ribeiro / Ag.Pará
Para Mônica Carvalho, que é cega e também uma das coordenadoras do Lamparina Acesa, a presença de um estande inclusivo em um evento de grande magnitude é fundamental para o reconhecimento de vozes que já foram muito silenciadas. 
“A democratização do acesso de pessoas com deficiência à informação é, antes de tudo, um reconhecimento das diferenças. É reconhecer que existem diferentes sujeitos que operam com diferentes formas de acessar, de ser e estar no mundo”, explica.
A Cadeira Mágica
Pelos corredores da feira, há histórias inspiradoras que carregam lições, como é o caso da cadeirante Delma Cunha, que encontrou na poesia o seu refúgio. A poeta e escritora passou cerca de 20 anos vendo a vida passar no formato das janelas de sua casa.
“Eu via a vida pela janela, com o que as minhas irmãs traziam da rua pra mim, e matava a minha sede com os livros. Demorou todo esse tempo para que eu entendesse que as pessoas nos veem a partir de como a gente se coloca no mundo”, conta.
No universo da escrita, Delma se encontrou e se empoderou lançando livros que vão desde a poesia até contos infantis, sendo um deles “A Cadeira Mágica” (2017), que ficou em primeiro lugar de vendas no estande do Escritor Paraense na Feira do Livro. A obra é um conto autobiográfico que conta a história da personagem cadeirante “Pititinha”.
“Eu coloquei no papel o que eu fiz na vida real, para ver além da cerca e ser vista. Tanto é que inventei essas asas na minha cadeira, que são também uma poesia que me libertou”, revela.
Mistura de traços
A presença e inclusão de todos e todas torna a 23ª Feira Pan Amazônica do Livro e das Multivozes um espaço para descoberta de talentos inegáveis. É o caso da jovem Isandra dos Santos. Surda e artista, a jovem mistura traços únicos com personagens preferidos da infância.
Incentivada pela família, a jovem sempre desenhou. Mas foi aos 3 anos de idade que ela despertou para o mundo do desenho ao ganhar um cavalo de pelúcia. Desde então, o animal é a inspiração da artista, que utiliza traços equinos em releituras de obras e é fã de Maurício de Souza e do cineasta Tim Burton.
“Eu via revistas em quadrinhos e me chamava atenção, sempre gostei de Turma da Mônica, das revistas que falam de cinema”, conta Isandra. “Eu curto muito cavalos, acho tão bonitos. Eu brincava desde criança com eles, ganhei alguns de pelúcia. São muito fofos”, completa.
Apesar do talento, Isandra enfrentou dificuldades para se comunicar até os 5 anos. Foi o que fez com que os pais aprendessem libras para se comunicarem com a filha. “A Isandra nasceu com 5 anos de idade, que foi quando eu comecei a ensinar os primeiros sinais de libras pra ela. Tudo que aprendia, eu ensinava e, desde aí, senti o despertar dela, que começou a melhorar na escola”, revela Isabelle dos Santos, mãe da artista.
Atualmente, a jovem sonha cursar artes visuais e aprimorar cada detalhe do seu traço. Enquanto isso, ela participa de sessões de equoterapia com cavalos da Polícia Militar, que convidou a jovem para ilustrar um livro infantil, contando a história do “Tapioca”, um dos animais utilizados nas sessões no Comando da Polícia.
Na edição mais inclusiva da Feira do livro e das Multivozes, variados pontos de vista, histórias e vivências ganham palco e se misturam em cada ponto do evento que, agora, compartilha com a sociedade diálogos atuais que merecem ser debatidos.


Fonte: Agência Pará (Texto e Foto)

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