Os miseráveis - Por Eduardo Machado

  Não, não estou falando de “Les Misérables”, o clássico do escritor francês Victor Hugo. Os miseráveis a que me refiro são aquele tipo de gente que é tão pobre, mas tão pobre, tão miserável, que só tem dinheiro.
            Já convivi com gente assim. Um sujeito que fazia parte da diretoria de uma escola onde trabalhei se orgulhava em dizer que já havia demitido, pessoalmente, mais de seiscentas pessoas. Outro, um radialista famoso, emprestava toda a sua indiscutível competência à tarefa de enganar os ouvintes vendendo espaço no rádio e na sua consciência a quem pagasse mais, Seu único objetivo era (e é) ganhar mais e mais dinheiro.
            Algum leitor já pode estar pensando que é dor de cotovelo. Afinal, como diz o dito popular atualizado, “dinheiro não trás felicidade, manda buscar, ou, se dinheiro não trás felicidade pelo menos te permite ser infeliz em Paris...”.
            Esse modo de pensar já é, por si, uma expressão da filosofia de vida desses miseráveis.
Muitos têm origem humilde, passaram falta, até fome. Por caminhos diversos fizeram fortuna, saíram da miséria, mas a miséria não saiu deles. E ela se expressa numa fome permanente e simbólica, retratada na ostentação de bens de alto preço, que escondem a carência absoluta de valores. Pois que preço e valor são coisas diferentes. Muito diferentes.
            Há nomes citáveis dessa miserabilidade a que me refiro. Fernando Collor é um deles. Herdeiro de um clã nordestino, desses que criaram dinastias insaciáveis, chegou à presidência no vácuo que se criou ao fim da ditadura e do governo do faraó, Jose Sarney. Collor foi eleito embalado pelos Globo Repórteres e capas da VEJA de então, temerosos com a ameaça de um certo ‘sapo barbudo’ chamado Lula.
            No poder, fez o que aprendeu: o olhar vidrado, altivo, o messiânico ‘minha gente’, dos discursos pedantes e vazios, a postura imperial, o ar de invencível, escondiam e revelavam o que ele sempre foi: o filhote de uma dessas oligarquias nordestinas que fazem fortuna e se mantém no poder, mantendo os “descamisados” naquela outra miséria, a da ignorância.
            Ele, que foi defenestrado da presidência, entre outras coisas, pela compra fraudulenta de um Fiat Elba, encheu a garagem da Dinda de Ferraris, Lamborghinis e Porches flagrados na LavaJato. Nem precisa de Freud para explicar.
            Outro caso, esse mais complicado, é o deputado Eduardo Cunha. Entrou na política pelos votos dos fieis da Igreja Neopentecostal Sara Nossa Terra, filiando-se ao recém-fundado partido da Reconstrução Nacional, o PRN de... Fernando Collor.
            Desde então, pulou de legenda em legenda até chegar ao PMDB, pelo qual se elegeu várias vezes deputado, representando o Rio de Janeiro, sempre embalado pelo discurso e voto evangélicos.
            Lula, quando ainda era deputado e respeitado, disse certa vez que havia 300 picaretas no congresso. Teria sido mais assertivo se dissesse 300 psicopatas.
A psicopatia é caracterizada, entre outras coisas, por comportamento antissocial, incapacidade de empatia, apetite incontrolável pelo poder ao qual chega por manipulação e dominância desmedida. Esse comportamento egocêntrico e egoísta busca espaço para se manifestar e prosperar em ambientes e profissões que favoreçam o exercício desse poder. A Política, por exemplo.
Tendo em vista sua absoluta insensibilidade pessoal e social, o psicopata sente-se à vontade, sem remorso ou culpa, para fraudar, roubar, mentir, manipular, chantagear, ameaçar e, por esses meios, exercer sua liderança e domínio.
Fraudar, roubar, mentir, manipular, chantagear, ameaçar... ou seja, Eduardo Cunha!
O pior, é que funciona, uma vez que os chantageados (os outros 299) são vulneráveis à chantagem, pois tem seus próprios esqueletos no armário.
É nítido, e assustador, o olhar ‘psicopático’ de Eduardo Cunha, quando se assenta na cadeira de Presidente da Câmara Federal e contempla os colegas deputados, no plenário à sua frente, como se dissesse, a modo de filme de terror: “eu sei o que vocês fizeram na eleição passada...”.