Sou de um País que se chama Pará


Poeta Ruy Barata é homenageado na Feira do Livro



Foi o poeta Ruy Barata que criou a frase "Eu sou de um país que se chama Pará", verso da composição "Porto Caribe" que exalta a grandiosidade do estado, e que virou música na voz de intérpretes como a cantora Lucinha Bastos. "Uma vez um representante de uma gravadora vetou o meu CD por causa dessa frase. Ele achava que era bairrismo. Eu gravei a música de forma independente", conta Lucinha.
A cantora não se arrepende da insistência, já que a música fez sucesso, assim como outras composições de Ruy Barata, que é o grande homenageado na XVII Feira Pan Amazônica do Livro, realizada no Hangar Centro de convenções em Belém. "O Ruy sempre falava muito das coisas do Pará", lembra Lucinha.
Ruy Barata nasceu em Santarém, oeste do estado, e veio para a capital aos 18 anos. Publicou livros e, aos 23 anos, se tornou deputado estadual. Por contato envolvimento político, foi perseguido pelo regime militar e acabou preso no prédio da 5ª Companhia Militar junto ao poeta Paes Loureiro.
Visitando a antiga prisão, hoje transformada em ponto turístico, Paes Loureiro relembra na Casa das Onze Janelas que o tempo de cela não foi em vão, ao menos para Ruy Barata. "Ele teve a ideia de reunir os presos, fazer uma roda e colocar um tema e discussão. Cada preso falava sobre um determinado assunto, dava opinião", relembra Paes Loureiro.
Paes Loureiro e Ruy Barata superaram o sufoco da prisão graças a uma afinidade que não se limitava à política. Na área artística, havia um grande entrosamento entre os dois: a casa onde Ruy morava era uma espécie de "lar" da música paraense.
Entre os parceiros de Ruy Barata estava o filho Paulo André, que trabalhou com o poeta em muitas composições como "Foi assim" e "Esse rio é minha rua". "A música feita entre essas quatro paredes ganhou o mundo", disse Paulo André.
Maria Diva também é filha do compositor, e conta que se orgulhava de ver o sucesso do pai. Na época em que cursava faculdade, ela lembra que Ruy Barata fazia poesias engajadas, com críticas políticas e sociais. Por conta disso, apesar do orgulho, havia também a preocupação. "Estava na época da ditadura, naquele momento havia preocupação", relata Maria Diva.
Para manter viva a obra de Ruy Barata, o médio Alfredo Oliveira decidiu reunir todo o legado do poeta em dois livros. Além disso, Barata também ganhou uma estátua no Parque da Residência em Belém, e recebe destaque na 17ª edição da Feira do Livro.
Ruy Barata morreu em 1990, aos 69 anos. No poema "Nativo de câncer", ele escreve sobre a vida: "Ah! como a vida é ligeira! Ah! como o tempo deflui! Este espelho não mais fala. da criança que já fui, das minhas rugas ruindo. apenas um nome rui".

Fonte: G1/PA


Poetas dos Poetas  -  É imenso o repertório de Rui Barata, que Fez do Rio a sua Rua e Foi Assim que ele tanto homenageou o Estado do Pará, com obras magníficas que resultaram no tema da Feira Pan Amazônica do Livro. (PV).

Anjo dos Abismos
O Quero chegar diante de ti
não como o vulto familiar que doura o teu sossego,
não como a imagem do sonho
que se perde na bruma,
mas como o fantasma de dentro de ti mesmo.
Quero chegar diante de ti,
e olharás minha longa cabeleira,
minhas faces esvoaçantes,
meus olhos incolores
e adivinharás que atravessei
os limites do eterno.
Ó esta noite todas as luzes estarão veladas pelo sono,
todos os silêncios serão devorados
pela eternidade,
todas as chagas ressurgirão das dores,
todos os olhos estarão desmesuradamente abertos
mas não poderemos sentir
a Sua presença
porque então passamos à pátria das essências.
Esta noite chegarei diante de ti,
nossas almas se confundirão na grande viagem,
nossos olhos se alongarão ao paraíso dos símbolos
onde nasce o grande mar das almas moribundas.
Chegarei sobre a tranqüilidade dos teus cânticos
e te assombrarás com este vulto notívago de morto
que se suspende milagrosamente além dos tempos
e que conduz as asas multicores
no derradeiro voo das espécies.
Ó sim sou eu por sobre as nebulosas,
fantasma que povoa quatro mundos,
imagem perdida e mais tarde encontrada
no limitado céu da poesia.