A dura realidade da vida de quem mora e trabalha no Lixão

Aspecto  do local onde funciona o lixão a céu aberto.



A falta de emprego é agravante e a única alternativa encontrada por algumas pessoas, é ter como meio de vida o serviço de catação de lixo, mas há expectativas de melhores condições para as famílias que lá trabalham e residem.

O nascer do sol resplandece a esperança de quase 40 famílias que por não terem alternativas de trabalho, se dispõem a encarar monturos de lixo a céu aberto, depositados em terreno improvisado que se transformou em local para o despejo diário da coleta feita na zona urbana da cidade de Capanema. Os motoristas dos caminhões escolhem os lugares onde há espaços livres para derramarem o lixo, razão para que os catadores procurem melhor posicionamento e assim começarem a garimpar objetos que sirvam para a reciclagem. Eles levam na prática e em poucos minutos seus bags (bergues) estão lotados de produtos para serem vendidos de acordo com a quantidade que for acumulada.

Catadores de lixo, trabalhadores de fibra e coragem.


Maria Célia, símbolo da mulher guerreira que trabalha
 com dignidade.  
 O raiar de um novo dia reforça a vontade de cada um dos moradores em poder ter bom faturamento com o que coletar e vender, pois é assim que age o grupo de pessoas que formam a comunidade Rainha da Paz, que trabalha unida, mas o sofrimento é presente. Aos 25 anos, Marcelo Sousa Nascimento, diz já estar adaptado ao serviço, por não ter conseguido emprego de carteira assinada, optando em ser mais um catador de lixo, para ganhar alguns trocados e tocar a vida do jeito que der. Além de Marcelo, outros homens e mulheres veem o tempo passar sem perspectivas de melhorias, mas não desanimam, cumprindo tarefas para garantirem seus sustentos.  
A média de ganho de um catador de lixo está na faixa dos R$ 700 mensais, sendo que esse valor aumenta de acordo com o crescimento do fluxo de material depositado na área destinada à descarga do lixo. Sem roupas adequadas os catadores transitam nas ruelas que se formaram e tudo o que arrecadam é armazenado no chão para posterior recolhimento e destinação. Na opinião de Clayton Ribeiro dos Santos Silva, 31 anos, a vida que eles levam como catadores de lixo é dura, mas o resultado do trabalho satisfaz a cada um, principalmente no que diz respeito a criação dos filhos , que precisam ser educados em escolas localizadas no centro da cidade, atividade que todos procuram cumprir. Na localidade não existe infraestrutura e as casas são construídas de forma aleatória, sem a obediência de arruamento. Também não existe saneamento básico e além do forte odor causado pelo acumulo de lixo, as fossas sanitárias contribuem para o aumento de riscos, pois nada é cuidado. A qualidade da água para o consumo das pessoas é comprometedora, pois segundo relatos, quem se serve do único poço existente na comunidade, precisa madrugar para conseguir sua quantidade do líquido precioso, para as necessidades diárias.


Aqueles que optaram por morar e trabalhar na área do lixão a céu aberto sabem dos riscos que correm, pois as doenças amedrontam, entretanto, a única válvula de escape é enfrentar os desafios que o lixão oferece e encarar as metas que para eles, são prioritárias, como geração de renda familiar. O fardo é pesado, mas precisa ser encarado por todos, conforme relato do catador de lixo George Luis da Cunha e Silva, 43 anos, considerado por todos como um dos mais experientes trabalhadores daquele local. Quando a situação se agrava e não há dinheiro para suprir as necessidades de casa, o elemento salvador aparece de imediato, tendo os catadores que vender algo, para resolver o problema, sendo que os produtos com mais facilidades para serem vendidos são o cobre e as latinhas de alumínio. Ao venderem esses produtos com rapidez, eles compram mercadorias de primeira necessidade para alimentar suas famílias e isso já se tornou atividade costumeira entre os integrantes da comunidade do lixão, que não tem amparo de uma Associação ou Cooperativa, sendo que eles preferem o individualismo na produção de seus serviços.
O espírito guerreiro da mulher, aparece como elemento de equilíbrio para as atividades exercidas pelos catadores de lixo e então, a domestica Maria Célia Andrade, que com apenas 35 anos é mãe de 7 filhos e está prestes a ser avó. Ela diz que trabalha todos os dias na coleta dos resíduos aproveitáveis do lixo e não sente nenhum tipo de constrangimento, pois tudo o que faz é com dignidade. A realidade encarada por Célia, reflete na necessidade que muita gente enfrenta, tendo como opção de vida, catar lixo para sobreviver.

Perigo: Presenças de crianças no ambiente, causam espantos
 Outro risco  encontrado pela equipe de reportagem é em relação a grande quantidade de crianças que moram no local e transitam por todas as extensões do Lixão, não sendo importunadas por ninguém. O direcionamento de atividades sócio educacionais é ausente, cabendo a cada família, encontrar meio possível para educar os filhos em outros pontos da cidade, pois mesmo com quase 200 habitantes a área do lixão não conta com creche ou escola. Levando em consideração que a Terceira Travessa Pedro Teixeira pertence a zona rural de Capanema e está a poucos quilômetros da cidade, o fator exclusão social não deve ser ponto estratégico, mas há urgência para que o Poder público inicie programa social que ampare os moradores daquela comunidade, que vivem em situação de alto estado de vulnerabilidade social, por não receberem atendimentos  adequados como mandam os conceitos assistenciais. Sendo assim, são reforçados os pedidos para que os setores da administração pública reservem espaços em seus cronogramas de trabalho, visando o bem estar de quem precisa de moradia digna e convivência familiar com mais serenidade.
As preocupações se acumulam e a queima constante de resíduos faz circular grande quantidade de fumaça, provocando possibilidades de que alguém adquira algum tipo de doença. Outro fator preocupante diz respeito ao avanço das agressões ambientais, como por exemplo, a quantidade de chorume e ameaça ao lençol freático, conforma sintetiza o geólogo Nilson Mesquita: - O chorume é um líquido, viscoso, muito escuro, altamente poluente, proveniente da putrefação da matéria orgânica lançada nos lixões a céu aberto. Tem cheiro muito forte e desagradável, podendo em época de chuvas percolar as camadas permeáveis da zona superior ao lençol freático, contaminando-o, assim como atingir as águas dos mananciais e recursos hídricos, podendo causar sérios riscos à saúde das comunidades circunvizinhas e forte agressão ambiental na fauna e na flora. A presença de metais pesados acumulativos que os organismos vivos não conseguem eliminar leva o ecossistema a sofrer sérios danos a curto, médio e longo prazo. Muitas doenças podem surgir na presença e contato com o chorume, tais como, diarreia, tumores no fígado e tireoide, dermatoses, problemas pulmonares, rinite alérgica, além de alterações gastrointestinais e neurológicas.

Reportagem e texto: Paulo Vasconcellos 
Edição:  Dyah Sousa
Fotos: Elza Melo, Dalva Vasconcellos e André Mello.